quarta-feira, 19 de outubro de 2011

O retorno do colosso

Já dizia Euclides da Cunha em um dos seus mais notórios romances: “o sertanejo é, antes de tudo, um forte”. Essa frase resume bem e, de certa forma, representa o que é a torcida do Santa Cruz.  O tricolor pernambucano representa um caso raro de uma torcida que tomou uma dimensão tão grande quanto o time que ela empurra das arquibancadas. Entre 2006 e 2010, o clube e a sua massa de seguidores conheceram todos os tipos de decepções e dificuldades que um clube, que outrora tivera tempos de glória e chegou a figurar entre os maiores do país, pode passar. Três rebaixamentos seguidos e duas participações seguidas, e frustrantes, na série D, a última do futebol profissional no Brasil, em nada amenizava um futuro que se vislumbrava cada dia mais negro.

O ano de 2011 começou com um pouco mais de planejamento, tendo a presidência do clube entregue ao experiente treinador Zé Teodoro a difícil missão de tentar tirar o Santa do fundo do poço. Bom conhecedor da realidade do futebol nordestino, o professor trouxe vários atletas de sua confiança e criou um grupo limitado, mas coeso e que demonstrava comprometimento. “O mais querido” entrou no estadual com um objetivo claro: conseguir a vaga para a série D, o que viesse, além disso, seria lucro, ainda mais sabendo que os principais rivais, Sport e Náutico, entravam na disputa com muito mais dinheiro e elencos mais qualificados e tendo o rubronegro a missão de defender o pentacampeonato e conquistar um inédito hexa. Todavia, graças a jogadores como Thiago Mathias, Thiago Cardoso, Everton Sena, Renatinho e, principalmente, o artilheiro Gilberto, a equipe do Arruda foi deixando para trás todos os adversários e derrotou o Sport na final, tendo vencido o Leão, dentro da Ilha do Retiro, de forma incontestável.

A torcida tricolor, e a alvirrubra da mesma forma, comemorou bastante o título do Pernambucano 2011, que não ia para as Repúblicas Independentes do Arruda desde 2005. Não obstante o entusiasmo, o objetivo de sair da série D ainda não fora alcançado e o Santa ainda havia perdido Gilberto, seu principal artilheiro, para o Internacional de Porto Alegre. Quando a competição começou, apesar do escasso plantel e da assiduidade dos jogadores ao departamento médico do clube, o Santa passou por Alecrim/RN, Guarany de Sobral, Porto de Caruaru e um xará do Rio Grande do Norte. Durante toda a campanha da primeira fase, o time era destaque dos principais jornais esportivos nacionais e alguns internacionais não pelo seu futebol, mas pela devoção de sua torcida que “invadiu” Coruripe e João Pessoa em algumas ocasiões para jogos que mais pareciam em sua casa do que na do adversário. 

Na segunda fase, o tricolor passou apertado pelo Coruripe, em Alagoas, com um empate de 0x0 que deixou o coração do torcedor angustiado até o apito final. A terceira fase era a mais importante do campeonato, pois quem passasse por ela já estava automaticamente ascendido à série C. E como tudo parece ser mais difícil para a cobra coral, o time enfrentaria o tradicional Treze-PB, que contava com o artilheiro Warley, ex-São Paulo. O jogo no estádio Amigão, em Campina Grande, foi um dos mais complicados e considerado o melhor jogo da competição, pois o Santa chegou a estar perdendo por dois a zero, mas, no final, a equipe pernambucana conseguiu um vitorioso empate, por pouco, não saiu com uma vitória, que lhe renderia uma boa vantagem para o jogo de volta.

Faltava o jogo de volta para consolidar a ascensão à série C. E o Recife parou: na semana que antecedeu ao jogo decisivo só se falou disso. Os tricolores estavam com esperanças renovadas e com uma, antes perdida, perspectiva de comemorar bons resultados. As ruas foram tomadas por camisas e bandeiras, os ingressos foram sendo vendidos rapidamente, atingindo a marca de 48.000 ingressos vendidos em apenas 72h. No domingo, segundo a contagem oficial, cerca de 63 mil espectadores lotaram o Colosso do Arruda para apoiar incondicionalmente a cobra coral. O jogo foi complicado e nervoso, o 0x0 angustiou todos os presentes até o último minuto, mostrando que para uma torcida sofrida nada vem fácil, mas o final foi o que todo torcedor tricolor almejava há muito tempo. Enfim, o Santa Cruz parece demonstrar forças suficientes para se levantar e sair de um poço que parecia não ter fundo. No dia seguinte, a cidade amanheceu pintada de vermelho, preto e branco, cheia de torcedores orgulhosos que já estavam contando histórias do passado recente como já sendo uma realidade distante e já pensando no título da competição, o primeiro da história, quase centenária do tricolor pernambucano.

O clube parece que, agora, está no caminho certo para voltar a viver seus tempos mais vitoriosos, organizando todo o seu departamento de futebol amador e profissional, já com planos para um centro de treinamento e um projeto para uma completa modernização do seu estádio. No entanto, o bem mais precioso do Santa Cruz é a sua torcida, uma massa que demonstrou um amor incondicional no pior dos cenários, mas é bom que isso não crie um certo conformismo em saber que ela estará sempre haja o que houver. O tricolor tem que cuidar dela com o maior cuidado, porque quem tem um bem dessa magnitude não pode subvalorizá-lo jamais, pois isso é que muitos clubes buscam durante toda a sua existência. Parabéns ao Santa Cruz Futebol Clube e que ele volte rápido para um lugar mais digno de sua história e importância.

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